domingo, 22 de janeiro de 2012

Out of Africa

Faltou um tronco a arder na lareira, para o serão ser perfeito. Mesmo assim, deixei-me embalar pelos diálogos enquanto tecia a capa de malha que usurpei à mãe queixosa de que o trabalho não avança por mor das dores no braço.

No écran, Maryl Streep exibia sem pudor o medo de ser singular. Perdida entre um divórcio anunciado e uma relação sem compromissos, os seus olhos denunciavam um quase desespero e só não amarrou o homem a uma cadeira porque isso seria, não só indigno, mas impraticável. Uma mulher sozinha em África! No início do século passado!

Algumas horas antes, nesse mesmo écran, estávamos em 1968 e um grupo de mulheres, operárias de uma fábrica da Ford no Reino Unido, lutava pelo direito de igualdade salarial. A cabecilha do movimento, uma rapariguinha de aspeto frágil, conseguiu, numa época em que Mary Quant fornecia às mulheres ferramentas para serem utilizadas em armas convencionais, parar uma das fábricas do maior empregador do mundo e, consequentemente, não só a aproximação em 93% ao salário dos homens, mas a aprovação da lei que determinaria a igualdade de género e a justeza salarial, meses mais tarde.

Em África, Karen von Blixen-Finecke, protagonizada por Meryl Strep, vencia todas as barreiras e espetava, sozinha, uma lança em África.

Do que teria ela sido capaz se tivesse ao seu lado alguém, não saberemos. Quanto à franzina que no final dos anos de 1960 parou a fábrica do Ford, sabemos que contou com o apoio, quase incondicional, do companheiro, e que isso lhe valeu, provavelmente, a solidez da vitória.

Há séculos que se houve que por detrás de um grande homem está sempre uma grande mulher. Tem-se partido do princípio que existem grandes homens, mas poucas ou nenhumas grandes mulheres. Não é o sexo que faz de nós grandes ou pequenos. São as circunstâncias e os apoios. Todos somos capazes de grandes feitos, mas poucos o são sozinhos.

No final, Denys Finch Hatton confessava, com um ar derrotado, que a baronesa lhe tinha roubado o prazer de estar só.

E eu, à medida que ia tecendo a capa da minha mãe, ia antecipando a alegria de ver alguém estragar, um dia, esta minha solidão.

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