terça-feira, 16 de julho de 2013

Estar vivo nem sempre é o contrário de estar morto

Habituaram-nos a pensar a vida como uma obrigação, um tem de ser, uma coisa que nos acontece e que temos de cumprir com sacrifício, esforço e espírito de cruzada e acreditar, apesar de tudo, que fomos abençoados só pelo facto de termos nascido como se tivéssemos feito muito mal a alguém e agora estivéssemos a  pagar por isso.
 
Nunca consegui engolir essa história. Ainda que seja obrigada a reconhecer que ela vive entranhada em mim e condiciona certos dias, certos momentos.
 
Curiosamente, condiciona-os muitas vezes pela negativa. Eu explico. Sou tão contrária ao sacrifício que sempre que me disponho a fazer qualquer coisa, não porque goste mas porque aprecio os resultados do depois e não tenho dinheiro para pagar a quem o faça, fico com o mesmo humor dos sacrifícios e das contrariedades apesar de o meu coração se sentir feliz com os resultados.
 
Ontem montei dois móveis e pendurei dez quadros. De dia para dia, e desde que entrei de férias, a casa está a compor-se, a deixar de parecer um acampamento cheio de caixotes e de coisas por fazer, para passar a ser um lar que dá vontade de cuidar. Até já me apetece regar as plantas! É verdade, nem as plantas mereciam a minha compaixão tal era a desarmonia! Não me dou bem com desarrumação. Não gosto de viver no caos. Gosto de ter as coisas no seu lugar e dá-me um prazer imenso vê-las cuidadas à minha volta e isso, só por si, deveria ser motivo de alegria e o suficiente para me aliviar o semblante que durante todo o processo se deixa pesar julgando ser sacrifício o que não passa de opção, escolha consciente e voluntária.
 
E não o são todas e sempre?
 
Não, nem todas são conscientes e muito menos voluntárias. Montámos uma máquina que não trabalha sem nós e quisemos acreditar que somos nós que não funcionamos sem ela. E como ela é, na verdade, contrária à nossa natureza – que nos impele à liberdade, ao desprendimento e à preguiça -,  resolvemos mudar, teoricamente, a tal natureza e espalhámos por aí que somos seres predestinados ao sacrifício e à dor.
 
Assim, à excepção de uma meia dúzia de sortudos que podem pagar a quem de direito para arrumar o seu pequeno mundinho. Os outros, como eu, suam as estopinhas para o fazer. Mas uma coisa é certa – o gozo que eu hoje sinto quando olho para os móveis e para as paredes, eles desconhecem.
 
E posto isto, estou quase a chegar à conclusão que afinal os sacrifícios valem a pena. Foi assim que nos enganaram. Se eu tivesse podido, já tinha as coisas mais que prontas e a esta hora estava, com certeza, a fazer algo muito mais interessante e a sentir-me ainda mais feliz, que isto de estar vivo tem que se lhe diga – sem os mínimos, na minha opinião, não vale a pena.

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